5 de março de 2012

Coluna do Senador Aécio Neves na Folha de São Paulo

Até quando? 


O país fica a cada dia menos federalista e mais concentrador. Trata-se de crônica doença do Estado brasileiro, que se adensou perigosamente como nunca antes na nossa história. 

Pouco importa a natureza do problema. O poder central contrapõe-se a qualquer iniciativa, por menor que seja, que possa lhe ameaçar ínfima fatia de um falso protagonismo salvacionista. 

O governo que tudo pode, e só ouve o que lhe interessa. Simplesmente dá de ombros diante de prefeitos já incorporados à paisagem dos protestos inúteis sobre a Esplanada dos Ministérios, mobilizados por migalhas de recursos. 

Agora, outro capítulo da anemia do pacto federativo se desenrola no campo dos Estados -governados por partidos diversos- engolfados por dívidas impagáveis com a União. 

A aritmética é simples: mesmo depois de mais de uma década de pagamentos substantivos, o valor nominal dessa dívida é maior hoje do que era no início do financiamento. 

E antes que me digam que aumentou em função do teto fixado para pagamento pelos Estados, respondo que a qualidade dos serviços públicos a que a população tem direito não pode ser regida pela lógica da matemática financeira. 

A fórmula, do fim dos anos 90 e importante naquele momento, não nos serve mais. 

Ofende o bom senso a diferença entre as generosas taxas praticadas para empréstimos subsidiados à iniciativa privada pelo BNDES -com claro prejuízo do poder público, que toma recursos no mercado a taxas muito mais altas para satisfazer a poucos escolhidos-, e aquelas que corrigem as dívidas dos Estados. 

Se é importante que o desenvolvimento seja estimulado por financiamentos mais baratos para todos, como justificar que os Estados, responsáveis por investimentos em saúde, educação e segurança, sejam penalizados pelo governo com encargos financeiros nas alturas? Como a União, ao mesmo tempo, incentiva o investimento privado e penaliza o investimento público? 

Por que o governo federal não usa, na correção das dívidas dos Estados com a União, o mesmo indexador que usa para corrigir as suas? 

O que não pode continuar prevalecendo é a lógica perversa que vem pautando o Planalto, de autorizar e estimular todas as demandas -ainda que justas- que geram ônus financeiro exclusivo para os entes federados, enquanto se exime de partilhar responsabilidades, optando por alternativas que fragilizam a federação e reforçam a concentração de recursos na União. 

Este é o momento de perguntar até quando apenas o governo federal -e não o país- vai se beneficiar dos sucessivos recordes de arrecadação. Ao fechar os olhos para essa realidade, o Planalto dilapida o que ainda nos resta de federação.  


Aécio Neves é Senador da República e escreve as segundas para a Folha

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