A discrição ética
Durante os quase oito anos em que o filho Aécio Neves exerceu as elevadas funções de governador do Estado de Minas Gerais, o seu pai, ex-deputado Aécio Cunha, manteve uma posição absolutamente discreta e distante dos atrativos do poder. Compareceu, é claro, à posse perante a Assembleia Legislativa e à solenidade no Palácio da Liberdade, mas procurou conservar-se fora do alcance dos holofotes oficiais. Reapareceu agora, quando o filho se afastou do cargo em cumprimento a um dispositivo legal, desincompatibilizando-se para concorrer ao Senado da República, ou, quem sabe, além dele. Os rumos políticos são sempre imprevisíveis, principalmente quando passam por Minas Gerais.
Para quem conhece e acompanha já faz mais tempo as longas estradas da vida pública mineira, o sempre discreto comportamento do ex-parlamentar com origem em Teófilo Otoni não surpreendeu. Foi sempre avesso, por formação e ética pessoal, ao exercício das bajulações, muito menos ao falso fascínio das badalações sociais. Seria natural que buscasse o terreno oficial da influência política, pois, afinal, o governador do Estado era seu filho. Optou, todavia, pela equidistância, mantendo-se fiel aos deveres de cidadão e aos apelos da própria consciência.
Não se conhecem indicações de Aécio Cunha para postos de destaque na administração nem instâncias em torno de possíveis favores oficiais. A discrição que revelou no início do governo, que agora chegou ao fim, foi mantida até o último dia do mandato que se encerrou na semana passada. Compareceu à posse e compareceu à despedida. Nada mais.
Nos primeiros anos do que se convencionou chamar de Nova República, o ex-deputado Aécio Cunha já havia se afastado da militância política, depois de ter sido eleito para a Câmara federal tantas vezes quantas foi candidato. O filho, na época, exercia o seu primeiro mandato junto ao Congresso, como herdeiro de uma respeitável tradição política. Do lado materno, era neto de Tancredo Neves; pelo ramo paterno, do ex-deputado e conceituado Tristão da Cunha, antigo militante do velho partido Republicano de Minas, comandado pelo ex-presidente Artur Bernardes.
Aécio, o pai, havia sido nomeado pelo presidente da República para ocupar o cargo de ministro do Tribunal de Contas da União, função altamente remunerada e vitalícia: receberia os proventos atribuídos ao posto enquanto vivesse. Um jornal do Rio de Janeiro, no entanto – que na certa não conhecia o caráter do mineiro do Vale do Mucuri – cometeu a leviandade de dar uma nota, segundo a qual a sua nomeação para o TCU tinha por forçar o jovem filho deputado federal a votar favoravelmente aos projetos enviados pelo governo.
Aécio Cunha não pensou duas vezes: no mesmo dia da publicação enviou ao presidente da República uma carta, renunciando, em caráter irrevogável, antes mesmo de tomar posse, à honrosa nomeação. Abriu mão do subsídio vitalício, mesmo nunca tendo sido um homem dotado de recursos financeiros mais generosos. Só não abriu mão de sua ética intocável e da dignidade pessoal que o acompanha ao longo do tempo. É uma figura que jamais deslustrou a história política de Minas.
Fonte: Roberto Elísio – Hoje em Dia
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