18 de outubro de 2010

Aécio Neves: “Ideia é mostrar que Serra somos todos nós”, afirma em entrevista a O Globo



Depois de conquistar no primeiro turno a maior vitória da oposição nesta eleição – garantiu a própria eleição e a do ex-presidente Itamar Franco (PPS) para o Senado, além da reeleição do governador Antonio Anastasia (PSDB) -, o tucano Aécio Neves se transforma, no segundo turno, no principal cabo eleitoral do candidato do PSDB à Presidência, José Serra. Esta semana, atendendo a um pedido de Serra, deixará os limites de Minas Gerais e começará um roteiro de viagens por Goiás, Mato Grosso, Pará, Piauí, Alagoas e Bahia.
Aécio considera que o segundo turno da disputa presidencial deixa um ensinamento especial para o PT e os coordenadores da campanha de Dilma Rousseff, que se deixaram levar, afirma ele, pela soberba e por acreditarem que a popularidade do presidente Lula seria suficiente para garantir a vitória à petista.
Aécio diz que Serra está aberto a sugestões e que as chances de vitória são boas, mas alerta que a eleição ainda não está decidida. Numa referência indireta à dificuldade atribuída a Serra de dividir o poder, Aécio diz que teve longas conversas com ele nos últimos dias: – Tenho percebido que ele quer governar com um grupo político.
Afirma também que não vê dificuldades para que Serra, se eleito, construa maioria no Congresso, e já faz elogios ao PMDB. Por fim, garante que não existe por trás do seu empenho qualquer acordo com Serra para que ele não dispute, se ganhar agora, a reeleição em 2014.
O GLOBO: Como pretende ajudar Serra neste segundo turno?
AÉCIO NEVES: Estou fechando uma agenda de viagens a partir desta semana. Estou indo, a pedido do Serra, para Goiás, Pará, Piauí, Alagoas e Bahia. Também devo ir a Cuiabá. Combinei de fazer com o Beto (Richa) um evento no Paraná. E ele também ficou de vir a Minas. A ideia é mostrar que a gente tem um time, que Serra não está sozinho.
A princípio, essas viagens serão sem o Serra. Em Minas, vamos fazer mais cinco eventos regionais, sendo um com Serra, em Montes Claros.
O senhor vai participar de todos esses eventos?
Aécio: Vou me dividir com o Anastasia. Naqueles em que o Serra não vier e eu estiver, quero fazer dobradinha com o Beto e o Geraldo (Alckmin). Vou estar por conta nesses próximos 15 dias. Propus um grande ato no dia 24 na orla do Rio, de caráter nacional, com figuras da sociedade civil, movimentos e setores que apoiam sua candidatura.
O que levou a disputa presidencial para o segundo turno? O presidente Lula errou na mão na campanha da Dilma?
Aécio: Não me refiro apenas ao presidente. A campanha da Dilma sempre foi permeada por certa soberba do seu entorno.
Lideranças que, talvez até por inexperiência política, achavam que osindicadores de pesquisa já garantiriam a eternidade no poder. Desconectaram de alguma forma a Dilma do sentimento do país. Transferiram para o presidente, que tem enorme popularidade e capacidade de transferência de votos, quase que a responsabilidade exclusiva pela eleição da Dilma. A transferência de votos existe, mas é relativa, não absoluta. O PT se fiou muito nisso. Não se preocupou em permitir que a candidata se mostrasse com mais naturalidade.
Essa é uma das razões da ida para o segundo turno.
Agora o clima mudou para a oposição?
Aécio: Assim como no primeiro turno, acho que não será fácil para nenhum dos lados.
Esta é uma eleição que está longe de estar definida.
Sempre achamos que a eleição tinha, sim, uma possibilidade de ir para o segundo turno.
Mas, independentemente do resultado final, que espero que dê a vitória para o Serra, o segundo turno foi muito bom para a democracia brasileira.
Porque baixa um pouco a bola daqueles que se reuniam não para traçar estratégias de campanha ou discutir as propostas da Dilma, mas para dividir espaços do governo.
A campanha de Serra, muito criticada antes, melhorou?
Aécio: Nenhum cidadão gosta de olhar para um candidato e ver uma figura isolada, autossuficiente e com viés autoritário. O Serra, que teve no início uma campanha muito fechada, veio abrindo e ampliando suas consultas.
Em determinado momento, tivemos uma dificuldade grande para apresentar sugestões e discutir rumos. Da segunda metade do primeiro turno para o final, a campanha se abriu um pouco mais.
Essa abertura do Serra facilita a campanha?
Aécio: Essa é, sem dúvida, uma das razões do êxito. Ninguém ganha uma eleição e muito menos governa uma nação solitariamente. Digo sempre que política é a arte da solidariedade.
E o Serra começa a demonstrar para as pessoas e cidadãos que tem um time político, que tem cara boa, que tem a cara do Geraldo, do Beto, do Itamar Franco, do Anastasia e de várias outras figuras.
Daí a ideia do seu empenho também fora de Minas..
Aécio: Fará bem à campanha do Serra que se dê visibilidade ao time com o qual ele governará.
O Serra disse, e concordo, que não temos de nos envergonhar de ninguém que esteja ao nosso lado. O outro lado talvez tenha a preocupação de esconder alguns deles. Quanto mais mostrar quem são as pessoas que vão governar com ele, mais se quebra as resistências. A ideia é mostrar que o Serra somos todos nós. Não é apenas o José Serra, ex-governador de São Paulo, mas um grupo político que acredita na meritocracia, que tem experiências administrativas exitosas em várias regiões do Brasil, compromissos com valores éticos, morais. Enfim, é mais do que um nome.
“Eu e nem mesmo o Serra nunca deixamos de ter laços com o PMDB”
Aqueles que queriam vê-lo candidato à Presidência este ano acham que uma vitória de Serra agora inviabilizará sua candidatura também em 2014.
Há algum acordo entre o senhor e Serra para que ele não dispute a reeleição, caso eleito, e apoie seu nome?
Aécio: Só quem não me conhece acharia que eu vou colocar um projeto meu, individual, à frente de um projeto do país. Apresentei no ano passado uma proposta de candidatura e a levei até onde achei que era possível. Quando percebi que poderia levar a uma cisão no partido, fiz minha opção, sem qualquer rancor. E fiz o que disse que faria, me dediquei à vitória do Anastasia.
Por que não aceitou ser vice de Serra?
Aécio: Declinei por achar que comprometeria a continuidade de um projeto exitoso em Minas.
Sigo muito a máxima do meu velho avô Tancredo Neves, que dizia que Presidência é destino, não é projeto. Eu me sentirei extremamente feliz de estar participando de um projeto de Brasil capitaneado por Serra. Tive pelo menos três conversas longas com Serra nos últimos dez dias e tenho percebido que ele quer governar com um grupo político
Como conquistar os votos dos eleitores da Marina?
Aécio: O PV em Minas já anunciou o apoio a Serra, assim como o PP. Além disso, há um movimento que é da sociedade, de pessoas que estão com receio do que possa significar o governo da Dilma com a influência que o PT autoritário e anti-democrático teria. Essa volúpia de alguns aliados por cargos. Quando uma aliança política é feita sem qualquer amálgama de projetos, sem qualquer identidade programática, ela se dá exclusivamente pela ocupação de cargos. Por isso é que vejo um pouco solta essa aliança em torno da Dilma.
O Congresso eleito não daria maioria a um eventual governo Serra. Isso preocupa?
Aécio: Vai depender muito da capacidade dele (Serra) e de seus aliados. Maioria se constrói em torno de um programa, um projeto. Obviamente que eu estarei à disposição dele para isso.
Teremos de ter conversas com várias forças políticas que estão do outro lado. Especialmente com o PMDB. Eu repito que o PMDB é um partido vital para governabilidade. Eu e nem mesmo o Serra nunca deixamos de ter alguns laços com o PMDB. E se vencermos as eleições, devemos chamá-los para uma conversa em torno dos interesses do país, assim como outros partidos que estão na base do governo atual.
Qual o principal desafio de Serra, se eleito?
Aécio: Apresentar ao país, nos primeiros 30 dias de governo, uma agenda de reformas.
Reformas só se realizam no primeiro ano de governo, quando há capital político.
Não se faz reforma constitucional no Brasil sem que o governo federal esteja engajado.
É preciso que o presidente tenha disposição, coragem política para fazer reformas por mais que possam contrariar interesses. E faltou isso neste governo.
Depois de oito anos no poder, o PT está maduro para voltar para a oposição?
Aécio: A oposição fará muito bem ao PT. Ao PT que nasceu como um partido de massas, representante da classe trabalhadora, com valores éticos, que nos fez a todos, até seus adversários, respeitá-los. Aqueles que ainda acreditam neste PT, talvez até prefiram que o partido faça essa reciclagem na oposição. O exercício do poder pode ter feito bem à vida de alguns petistas, mas não fez muito bem à história do PT. O Brasil precisa de um partido como o PT e eu espero que ele na oposição possa se reciclar. O que me chama a atenção é a falta de generosidade do PT de reconhecer que o Brasil não foi descoberto por eles. Eles têm uma dificuldade quase física de verbalizar isso, de reconhecer em outros algum mérito. Eu, por exemplo, reconheço méritos do governo do presidente Lula, mas esses resultados foram atingidos porque, antes, tivemos os governos do Itamar Franco e do Fernando Henrique Cardoso.

Fonte: Adriana Vasconcelos – O Globo

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